A análise aos adversários de Portugal no Grupo H do Mundial 2022

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Está quase. Portugal, que assegurou a oitava presença em Mundiais, a sexta consecutiva, vai arrancar a participação no Mundial 2022 esta quinta-feira, a partir das 16h00, diante do Gana. As expectativas são elevadas, o lote de 26 jogadores é de alto calibre. Qualidade não falta, mas será que Fernando Santos conseguirá definir uma ideia de jogo, estabilizar um “onze” ambicioso e equilibrando e que consiga potenciar todo o arsenal que tem em mãos?

No Grupo H do Qatar 2022, a turma das quinas vai defrontar três adversários provenientes de três continentes diferentes: o sul-americano Uruguai, carrasco luso em 2018 na Rússia, nos oitavos-de-final, a asiática Coreia do Sul, treinada por Paulo Bento e a africana Gana, que chega a solo catari reforçada com várias lanças. Vamos esmiuçar as virtudes e fraquezas dos três opositores com a ajuda das nossas stats e com a opinião avalizada do comentador Tomás da Cunha.

“Black stars” reforçaram-se com peças sonantes

O Gana será o primeiro opositor dos homens de Fernando Santos. As “estrelas negras” recrutaram vários elementos nos últimos meses, chegam ao deserto catari com novas lanças e poderão atrapalhar as pretensões lusas. “É uma equipa bastante difícil de antever, por duas razões. Primeiro porque Otto Addo não é seleccionador há muito tempo, muito menos em jogos oficiais, e segundo porque tem jogadores que foram reforços neste ciclo para o Mundial, casos de Salisu, Lamptey, Iñaki Williams, por exemplo, alguns com potencial para serem titulares, e, nesse sentido, é uma selecção algo imprevisível e que poderá ser traiçoeira para Portugal”, começa por explicar Tomás da Cunha em declarações à GoalPoint.

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Clique na imagem para ler em detalhe (foto: J. Trindade / Infografia: GoalPoint)

Em termos tácticos, o esquadrão africano oscila entre três desenhos, os habituais 1x4x2x3x1 e 1x4x3x3, ou o 1x5x3x2, que tem sido testado mais recentemente.

“Em princípio, o Gana vai organizar-se entre o 1x4x3x3 e o 1x4x2x3x1, com Thomas Partey à frente da defesa. É o grande pilar, a estrela, um dos melhores médios da actualidade, ao serviço do Arsenal, quer como distribuidor, quer ao nível da recuperação de bola. E depois, poderemos enquadrá-lo com uma eventual revelação deste torneio, Kudus, um médio-defensivo canhoto, forte na condução de bola pela mudança de velocidade, também com agressividade na chegada à área. Penso que este sector do meio-campo poderá ser bastante difícil de travar para Portugal e é a grande dificuldade que a selecção de Fernando Santos pode enfrentar, assumindo que o Gana vai jogar num destes dois sistemas tácticos. Digo isto porque contra o Brasil na segunda-parte, vimos a equipa actuar mais num 1x5x3x2 e poderia ser, eventualmente, uma solução estudada”, observa o comentador da Eleven Sports, TSF e cronista na Tribuna Expresso.

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Uma equipa de contra-ataque

Antevendo o encontro desta quinta-feira, a turma ganesa deverá conceder a iniciativa a Portugal e explorar os lances de ataque rápido.

“Do meio-campo para a frente há algumas soluções, mas parece faltar um grande avançado como era, por exemplo, Asamoah Gyan. A responsabilidade está em cima de Iñaki Williams, mas é um jogador de ataque rápido, não é propriamente um ponta-de-lança, vamos ver se consegue destacar-se nesta competição. Mas pelas características do ataque, esta equipa será sempre muito mais focada para o contra-ataque, para a exploração dos espaços nas costas da defesa, com Iñaki, Sulemana ou Sowah e Kudus a tentar fazer a ligação entre Thomas Partey e os homens da frente. Uma equipa que deve ceder a iniciativa a Portugal e que depois deve tentar sair mais em ataque rápido. É este o perfil do Gana”.

O seleccionador Otto Addo, que foi internacional alemão, tem em mãos um plantel com bastante potencial, que concilia a experiência dos “manos” Ayew e o futebol explosivo de alguns jovens emergentes, entre eles um jogador que representa o Sporting.

“Esta equipa está a tentar renovar-se, não só com os actuais reforços, mas com uma série de jovens que podem ter impacto num futuro próximo, não só Kudus e Lamptey, mas também Fatawu, um médio-ofensivo canhoto que joga a partir da direita, que tem um remate muito fácil – não é impossível que seja titular, há essa possibilidade – e também de Sulemana, um jogador muito imprevisível no drible, rápido, que também pode ser chamado à titularidade”, salienta o analista.

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Bentancur, Valverde e Darwin Núñez

Na última edição do Mundial, Portugal caiu aos pés do Uruguai nos oitavos-de-final, em território russo. Quatro anos volvidos, o reencontro está marcado para o próximo dia 28 de Novembro no Estádio Lusail. Além dos eternos Muslera, Godín, Luis Suárez ou Cavani – carrasco no embate em Sochi com um bis –, os sul-americanos estão num processo de renovação, com diversos jovens a assumirem o leme da equipa.

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GoalPoint-Uruguay-Portugal-WC2018-Ratings

“É claramente a selecção que poderá rivalizar com Portugal no que diz respeito ao primeiro lugar do grupo. São as duas favoritas. Se olharmos para a qualidade global deste elenco uruguaio e até para o nível do ‘onze’, é sem dúvida aquele que mais se aproxima da nossa seleção, e por aí podemos, de facto, esperar dificuldades neste jogo em particular e um Uruguai a lutar pelo primeiro lugar. Chega a este Mundial numa transição completa, Óscar Tabárez já não está no cargo, é um treinador mítico do futebol uruguaio, deu o lugar a um técnico mais jovem, Diego Alonso, com outras ideias, mais capaz de fazer a transição geracional, e é nessa fase que o Uruguai chega a este Mundial, com um futebol mais capaz de proporcionar aos jogadores tecnicistas, criativos, que tenham outro tipo de condições para jogar desde trás, para ligar mais o jogo. Com Tabárez era uma equipa muito mais combativa. Ainda com jogadores como Suárez, Cavani, mas também com atletas da nova geração, casos de Valverde, Bentancur, Darwin, entre outros, estes deverão fazer parte do ‘onze’ titular”.

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Tal como o Gana, a maior fortaleza dos uruguaios está na zona central, onde além de Bentancur e de Valverde, moram duas unidades que brilham no River Plate e Flamengo, respectivamente.

“O Uruguai deve assumir o 1x4x4x2, é esse o sistema preferencial para ter Valverde e Bentancur na zona central, mais dois médios interiores que aparecem bastante por dentro, De la Cruz e De Arrascaeta, este que é a referência criativa desta selecção. É o sector com mais qualidade neste momento, desde logo porque tem dois dos melhores médios da Europa esta temporada: Valverde, que é um médio de transporte, sempre muito disponível na pressão, mas também goleador, e Bentancur, um médio com chegada à área contrária, com golo nos lances de bola parada, que está a assumir-se na condução. Ambos poderão formar uma dupla fantástica e a carregar o Uruguai.”

“E depois na frente vamos ver quem fará companhia a Darwin, se Suárez, Cavani, qual é o papel que vão ter ainda neste Mundial, sobretudo o primeiro que está numa fase muito adiantada da carreira, voltou ao Uruguai para jogar no Nacional. Nesta altura, é uma incógnita perceber o que Suárez pode dar ainda, neste que será, certamente, o seu último Mundial.”

“Mais atrás a equipa já não tem as mesmas referências de outros tempos. Há uma nova geração a emergir com Ronald Araújo, que esteve algum tempo lesionado e não sabemos se estará a 100%. De qualquer forma, pode ser o patrão defensivo deste conjunto ‘charrúa’, que tem também laterais com alguma qualidade, sobretudo do lado esquerdo, com Mathías Olivera. No entanto, falta uma grande referência na baliza. Em tempos, Muslera foi o dono, já está numa fase diferente na carreira, pode até ser Rochet o guarda-redes que comece a prova, mas não é claramente um jogador ao nível do resto do plantel”, descreve Tomás da Cunha.

“Outsider” treinado por Paulo Bento

No último jogo nesta fase de grupos, a turma de Fernando Santos vai defrontar a Coreia do Sul orientada por Paulo Bento – seleccionador que esteve nas fases finais do Euro 2012 e do Mundial 2014 e que foi substituído precisamente pelo Engenheiro em plena campanha para o Euro 2016. Os sul-coreanos correm por fora e poderão surpreender os mais desprevenidos. Há muita qualidade no lote de 26 jogadores que o técnico português chamou para o Qatar.

“É sempre difícil adivinhar que Coreia do Sul poderemos ter nos Mundiais. É uma selecção que consegue colocar cada vez mais jogadores em clubes europeus relevantes, mas não consegue dar um salto definitivo que lhe permita tornar-se, desde logo, a selecção número um, indiscutivelmente, no futebol asiático, e não tem, à partida, esse estatuto neste Mundial. De qualquer forma, Paulo Bento tem uma geração interessantíssima em mãos, sobretudo do meio-campo para a frente, mas não esquecendo certas peças em determinados sectores”, observa o comentador, que realça algumas.

“Desde logo, Kim Min-jae, um dos jogadores em destaque na Série A ao serviço do Nápoles, um central muito seguro no posicionamento, nos duelos, também a construir consegue marcar a diferença, e pode ser um dos líderes desta selecção. No meio-campo, Hwang In-beom que é um dos médios do 1x4x2x3x1 habitualmente utilizado por Paulo Bento, um jogador construtor que se destaca, sobretudo, a nível de sentido posicional, pela forma como organiza a equipa através do passe, que teve uma carreira algo secundária, mas que neste tipo de competição curta pode exibir-se ao mais alto nível. Depois há muitas opções para Paulo Bento gerir no ataque.”

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“A grande estrela é Son, partindo do lado esquerdo para dentro, e depois há outras opções a explodir: Lee Kang-in que é um dos candidatos a revelação do torneio, um médio-ofensivo canhoto que já foi considerado o melhor jogador do Mundial sub-20 e que está a fazer uma bela temporada ao serviço do Mallorca, que pode actuar a partir da direita ou do corredor central. Hwang Hee-chan não está a fazer uma época famosa no Wolves, mas ao nível da selecção pode oferecer as qualidades que se lhe reconhecem na explosão, facilidade de remate e. Finalmente, Hwang Ui-jo que é um jogador com outra capacidade no jogo em apoio, que pode ajudar Paulo Bento a ter um perfil diferente, um avançado que combine mais com os médios”.

No papel, será mais um jogo em que Portugal deverá assumir as rédeas da partida frente a um opositor que jogará com o bloco recuado, à espera de contra-atacar de forma cirúrgica e mortífera.

“Esta equipa tem capacidade para se organizar defensivamente, esperando um pouco mais atrás pelos adversários e aproveitando a qualidade de Kim Min-jae, e depois valorizar a bola quando a tem, sobretudo procurando ataques mais rápidos, tentando explorar as costas do opositor. A Coreia do Sul é, talvez, a grande ‘outsider’ deste grupo, não tem responsabilidade, não tem estatuto à partida para seguir em frente, mas pode ser um adversário difícil de superar e que pode baralhar um pouco as contas. Não sendo Portugal ou o Uruguai, possui ainda assim um plantel muito interessante para ser explorado por Paulo Bento e há potencial para fazer uma ‘gracinha’, remata Tomás da Cunha.

Feitas as devidas análises, será que a Selecção Nacional conseguirá ultrapassar esta primeira fase? Recorde-se que, após o quarto lugar no Mundial da Alemanha em 2006, os desempenhos nas fases finais não foram nada satisfatórios. Em 2010 Portugal foi eliminado pela Espanha nos oitavos-de-final, quatro anos depois não passou a fase de grupos no Brasil e em solo russo voltou a baquear nos “oitavos”. A estreia de Portugal no Grupo H está marcada para esta quinta-feira, diante do Gana, no Estádio 974, em Doha, depois vai defrontar o Uruguai no dia 28 Novembro e a Coreia do Sul, de Paulo Bento, a 2 de Dezembro.

Leonel Gomes
Leonel Gomes
Amante das letras, já escreveu nos jornais A Bola, Público e o O Jogo, dedicando-se também ao Social Media Management desde 2014. Tornou-se GoalPointer na "janela de mercado" do verão de 2019.