João Mário: como se compara o João de Jesus e o Mário de Amorim

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(artigo publiicado originalmente a 8 de Julho de 2021)

João Mário atingiu, no Outono de 2016, a valorização mais elevada da sua carreira – €35M – na sequência de uma época inesquecível ao serviço do Sporting e Selecção, que viria a culminar na transferência para o Inter (40M€). Passados cinco anos o jogador nunca se chegou a afirmar ao serviço dos “nerazzurri” e, após passagens por Inglaterra (West Ham) e Rússia (Lokomotiv) por empréstimo, foi precisamente de “leão” ao peito que o médio voltou a protagonizar um desempenho comparável com o que apresentou na agora longínqua época de 2015/16.

O João de 2016 ou o Mário de 2021?

O período de tranquilo renascimento pode ter sido sol de pouca dura. João Mário está, por estes dias, envolvido na novela que agita o “morno” mercado português de Verão, supostamente cobiçado por Sporting e Benfica e, fazendo fé no que avançam os muitos especialistas do “leva-e-traz”, a um passo de optar pelos “encarnados”, com muitos opinadores a referirem-no como parte da potencial solução para os problemas do meio-campo central “encarnado”, com base no que jogou ao serviço dos “leões”.

Mas será mesmo assim? Com que João contou Rúben Amorim na última época de glória e como se compara ele com o Mário que brilhou em 15/16 sob as ordens de Jorge Jesus, o técnico que supostamente agora o cobiça?

Papéis diferentes, analytics diferentes

Uma comparação entre as duas “caras” de João Mário ao serviço de Amorim e Jesus ganha sustentação rápida, ao analisarmos que terrenos pisou, com bola ou em função dela, nas Ligas em causa. Regressando a 2015/16, importa referir que João Mário, médio-centro de vocação, começou a época precisamente nessa posição, mas não só acabou por cumprir outras funções (inclusive a de segundo avançado, em algumas partidas), como foi a médio-direito que estabilizou nas opções de Jorge Jesus, ainda que com liberdade para realizar incursões interiores, compatíveis com as suas qualidades.

Já sob o comando de Rúben Amorim, o médio acabou por fazer dupla regular com João Palhinha, precisamente como “8”, mesmo tendo por vezes sido chamado a encostar à direita, como nos “velhos tempos”, mas sempre com duas diferenças que resultam claras nos mapas que a seguir mostramos: João Mário teve menos bola (72 acções com bola por jogo em 20/21, contra 87 com Jorge Jesus) e operou normalmente em zonas mais distantes da baliza adversária.

[ As acções com bola e heatmaps de João Mário na Liga 15/16 versus 2020/21 ]

Uma das visualizações que melhor ilustram as diferenças entre os “Joões” comparados inclui os resumos de acções ofensivas perigosas do jogador nas duas épocas em análise, e que permite identificar não só a diferença acima referida como também uma variação de quantidade e preponderância ofensiva: o jogo do médio em 15/16 mostra-se mais próximo da área e quantitativamente mais generoso, confirmando-se as consequências positivas da opção que Jesus tomou (a partir da 7ª jornada, por volta de Outubro de 2015) em colocá-lo sobre o flanco direito.

[ As acções ofensivas perigosas de João Mário na Liga, em 15/16 e 20/21
Legenda: linhas – conduções verticais, estrelas – dribles, setas – faltas conquistadas ]

Mais próximo da baliza, maior relação com o golo

A maior proximidade para com a baliza contrária oferecida por Jesus justifica com naturalidade a grande diferença entre o número de acções para golo assinadas por João Mário nessa época (seis tentos e dez assistências) e as três (dois golos e uma assistência) que rubricou na Liga 20/21. A contribuição ofensiva objectiva (peso nos golos e assistências, nos minutos em que esteve em campo) é também muito diferente: se esta época João Mário teve dedo em 7,7% dos golos leoninos no campeonato, em 20/21 chegou aos 24,2%.

[ Os 6 golos de João Mário na Liga 15/16, todos de bola corrida versus os dois tentos obtidos de grande penalidade, em 20/21 ]

[ As 10 assistências do médio em 15/16 e a única entrega para golo, em 20/21 ]

Curiosamente os números médios de remate e sobretudo de passes para finalização não são dramaticamente diferentes entre épocas, o que serve de exemplo do porquê de não ser avisado olhar apenas a números simples sem ter em conta outras variáveis (contexto, distância, enquadramento) que caracterizaram essas acções.

[ Os locais de origem dos remates do médio em 15/16 e 20/21. A amarelo golos, a azul enquadrados, a vermelho desenquadrados ]

[ O mapa de passes para finalização de 15/16 (esquerda) mostra não só um João Mário de serviço nos cantos pela direita como também maior frequência de passes-chave dentro e nas imediações da área adversária ]

Anda no capítulo do passe, é interessante perceber que, apesar de ter sido em 20/21 que João Mário beneficiou de uma função mais própria de um “regista”, foi novamente em 15/16 que tentou mais passes por jogo (60, contra 51 na última época), sem que isso influenciasse em demasia a sua eficácia global na entrega (85% vs 88%). A diferença resulta clara, sim, e a favor do João de 2016, na contabilização de passes ofensivos valiosos (6,1, o dobro de 20/21), embora também seja necessário ter em conta as diferenças entre o estilo mais directo e vertical de Amorim e o processo mais “rendilhado” de Jesus.

E a defender? Surpresa…

Um João em dupla com Palhinha, envolvido no sistema “arriscado” de Amorim, faria prever um maior envolvimento defensivo, quando comparado o Mário predominantemente ofensivo, inserido por Jorge Jesus, num mais tradicional 4-4-2. No entanto… os dados não o confirmam. A verdade é que, apesar de jogar mais próximo da baliza contrária em 15/16, o médio não deixou de somar uma média de acções defensivas superior à que manteve na última época, partindo de uma posição mais conservadora/distante do último terço e com teóricas maiores preocupações defensivas.

[O mapa de acções defensivas de João Mário em 15/16 versus 20/21 ]

João Mário somou uma média de 3,2 acções defensivas (desarmes, intercepções, alívios, bloqueios de posse/remate) na Liga em 20/21, contra 5,1 em 15/16. O mapa seguinte confirma visualmente o que os números confirmam: João Mário defendeu activamente mais, logo na saída de bola do adversário, mas também nos dois terços defensivos do campo e, mais uma vez, com maior incidência no corredor direito leonino.

Que João Mário querem (ou não) os rivais lisboetas?

Muito mais dados havia a mostrar, mas quase todos apontando à mesa conclusão: João Mário foi importante no desempenho dos dois Sportings em análise, mas os analytics mostram-no mais generoso e preponderante, sobretudo no plano ofensivo, na sua versão 15/16. Dizer que um é melhor que o outro seria simplista pois a verdade é que Rúben Amorim terá tido o João Mário do qual considerava precisar, e ambos saíram vencedores (campeões) com essa opção.

Quererá isso dizer que é esse o João Mário que Jesus procura e não um que venha, por exemplo, a assumir o papel de Adel Taarabt no miolo “encarnado”? Será também por isto que, fazendo fé nas parangonas desportivas, o Sporting pode não estar disposto a investir o que Inter e jogador esperam na sua permanência? São questões que ficam para o domínio da especulação. Para nós ficou o exercício que aqui concluímos, e que permite não só compreender que o desempenho de João Mário não se resume ao que demonstrou na última época e que os analytics permitem hoje analisar, ao pormenor, nuances que outrora ficariam apenas no plano do “achómetro a olho”.

GoalPoint
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