Artigo originalmente publicado a 7 de Setembro de 2022
Leão ao ataque. Pela segunda época consecutiva, o Sporting carimbou acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões. Pela frente, os vice-campeões nacionais medem forças com o Eintracht Frankfurt, Tottenham e Marselha – tendo já batido alemães e inglês. Conseguirão os “leões” repetir a façanha alcançada na temporada transcorrida e rugirem até aos oitavos-de-final? Após o histórico triunfo por 3-0 em casa do Eintracht, e em Alvalade ante os “spurs”, essa possibilidade ganhou nova dimensão.
No papel, este Grupo D é um dos mais equilibrados da prova, talvez o Tottenham parta com um ligeiro favoritismo, mas tudo poderá acontecer, ou não fosse esta a Liga dos Campeões. Vamos olhar para os adversários do emblema de Alvalade para tentar perceber o que a equipa portuguesa irá encontrar.
Marseille, uma força de pressão
[ O último jogo do Marseille na Ligue 1 ]
O Marselha viveu um período atribulado durante o mercado de transferências, que redundou com a troca no comando técnico da equipa. Jorge Sampaoli saiu, entrou Igor Tudor e foram inúmeras as contratações asseguradas – foram gastos cerca de €75M –, com destaque para os ingressos dos bem conhecidos Chancel Mbemba (chegou a custo zero), Nuno Tavares (emprestado pelo Arsenal), e ainda, por exemplo, Jordan Veretout, Luis Suárez (o colombiano), Alexis Sánchez ou Jonathan Clauss.
[ Remates/xG (esquerda), conduções aproximativas, dribles e faltas sofridas, e acções defensivas (direita) do Marseille nesta Ligue 1 ]
Alinhado num 1x3x4x2x1 muito móvel, os “gauleses” são vigorosos no ataque – já levam 13 golos assinados na Liga francesa – e estão mais consistentes a defender – apenas três tentos consentidos em seis jornadas da Ligue 1, onde ocupam a vice-liderança com os mesmos 16 pontos do que o todo o poderoso PSG, fruto de cinco triunfos e apenas um empate.
Sexto na Liga em xG criados (mapa da esquerda), são a quinta em remates (86) e diversificam bastante as zonas de pressão, onde aplicam acções defensivas (mapa da direita), muitas delas no meio-campo adversário, sendo a segunda formação da Ligue 1 a fazê-lo nessa zona do terreno, com 85. É de esperar uma pressão adiantada, o que obrigará o Sporting a rápidas trocas de bola, mas abrirá caminho para explorar o futebol de transição leonino.
De Nuno Tavares a Alexis Sánchez
Que grande arranque de época de Nuno Tavares na Ligue 1. Seis jogos, três golos e exibições que têm aguçado o apetite da exigente massa adepta do OM. Com total liberdade, tem aproveitado a segurança do trio defensivo para acelerar pela faixa esquerda, tornando-se num dos principais agitadores da equipa e aproveitando o seu forte remate para fazer estragos.
Há também Gerson, ex-Flamengo e uma das principais pedras do meio-campo do Marseille, a experiência do veterano Alexis Sánchez, que leva três golos em cinco rondas do campeonato, e o relativamente discreto Jonathan Clauss. O lateral-direito francês foi uma das contratações da equipa e começa a justificar os €7,5M pagos ao Lens. Veloz, sólido tacticamente e extremamente ofensivo, o internacional francês – chegou à selecção aos 29 anos – é mais uma lança que o Sporting terá de prestar atenção.
Tottenham, um “tubarão” da Premier League
[ O último jogo do Tottenham na Premier League ]
Após um período de adaptação, Antonio Conte exigiu que o clube abrisse os cordões à bolsa, e foi isso que aconteceu. Os “spurs” apetrecharam o plantel e asseguraram durante o Verão os seguintes reforços: Richarlison, Yves Bissouma, Djed Spence, Ivan Perisic (custo zero), Fraser Forster e Clément Lenglet. Os €169,90M já incluem o valor pago à Atalanta pelo passe de Romero (que estava emprestado) e o que será transferido para a conta da Udinese por causa do jovem Destiny Udogie (só irá para Londres no final desta época).
[ Remates/xG (esquerda), conduções aproximativas, dribles e faltas sofridas, e acções defensivas (direita) do Tottenham nesta EPL ]
O 1x3x4x2x1 mantém-se imutável, a segurança defensiva é o sustentáculo de tudo, os corredores ganham uma preponderância vital (como se pode constatar no mapa de cima ao centro), Pierre Hojbjerg e Rodrigo Bentancur, a “força da técnica e a técnica da força”, complementam-se na perfeição na zona central do meio-campo e o trio de ataque formado por Son, Dejan Kulusevski e Kane poderá fazer estragos num ápice. O plantel tem mais opções para o treinador italiano gerir ao longo da maratona de jogos e, mesmo sem encantar, a formação do norte de Londres está a realizar um início de época seguro, somando em seis jornadas da Premier League quatro triunfos, dois empates, 12 golos marcados e cinco sofridos.
Nesta altura da Premier League, o Tottenham é a quarta equipa mais rematadora, com 92 disparos (Liverpool lidera com 117), é a quinta em xG a favor (mapa de cima à esquerda), com 10,4, e tem um carimbo italiano de Conte bem vincado em termos defensivos, preferindo recuar (mapa à direita) e esperar pelo erro do adversário, aplicando depois a velocidade de Son e companhia.
Soluções para todos os gostos
Não nos podemos esquecer, contudo, de Hugo Lloris. O experiente guardião francês é uma espécie de porto seguro, respondendo com à altura sempre que é chamado a intervir. Parte do sucesso da equipa, passa por aquilo que consegue travar. Depois é esperar que Harry Kane faça magia. O atacante, certamente no top-5 dos melhores avançados do mundo, é mortífero quando tem de atacar as redes contrários, e é ainda o principal pensador do conjunto, baixando muitas vezes no terreno para articular as acções da equipa. Os números falam por si, já com cinco golos em seis jornadas da Liga inglesa e uma ligação como nenhuma outra com o coreano Son.
Eintracht, a ameaça alemã
[ O esquema táctico do Eintracht no último jogo da Bundesliga… e deu resultado ]
A viagem leonina em busca dos milhões vai arrancar em solo alemão, frente ao Eintracht. Vencedor da última edição da Liga Europa, o conjunto germânico contabiliza até ao momento sete jogos oficiais, venceu três, empatou dois e saiu derrotado noutros tantos, apresentando algumas características que o Sporting pode aproveitar em seu benefício.
Após os primeiros percalços, Oliver Glasner decidiu mudar o sistema táctico, abdicando do 1x3x4x2x1 e apostando num 1x4x2x3x1 desde o empate ante o Colónia que ocorreu na ronda 3 da Bundesliga. Apesar da alteração no esquema, a equipa onde milita Aurélio Buta mantém as principais marcas que a têm distinguida, é voraz e intensa no ataque à baliza contrária, vertical, tentando em poucos toques chegar às zonas de finalização e coloca diversos elementos no processo ofensivo – 15 tentos apontados, 11 na Bundesliga –, mas, em contrapartida, denota fragilidades a defender, cometendo com muita frequência erros básicos no posicionamento e na tomada de decisão.
[ Conduções aproximativas, dribles e faltas sofridas (esquerda), remates/xG e acções defensivas (direita) do Eintracht nesta Bundesliga ]
Os 13 golos que a equipa sofreu em sete encontros (11 na Bundesliga) falam por si. Os comandados de Glasner adoram “partir” o jogo e levá-lo a dimensão de loucura, onde tudo pode acontecer. No meio do caos, cabe ao “maestro” Mario Götze cadenciar os ritmos e colocar pausa e gelo nos momentos certos. Nos mapas acima nota-se a tendência clara de atacar em condução pelo flanco esquerdo, onde o japonês Kamada (apontado neste mercado de transferências ao Benfica) é uma das principais, senão a figura de proa neste Eintracht.
Esta vertigem ofensiva permite ao emblema de Frankfurt, à quinta jornada da Bundesliga, ser a sexta equipa no que toca a Expected Goals (xG) criados através dos seus remates (mapa em cima ao centro), nada menos que 7,9, registando mais três tentos do que o expectável, embora seja apenas a penúltima em disparos, num total de 52 (só o Bayern contabiliza 123). Olhando para o mapa da direita, constata-se que o Sporting vai ter dificuldades em explorar a profundidade como tanto gosta, uma vez que os alemães privilegiam o seu próprio meio-campo para realizar acções defensivas, em vez da pressão mais à frente.
A equipa começa a construir as investidas atacantes desde trás, os laterais nesta fase não sobem muito no terreno e, numa segunda instância, quando a bola chega ao meio-campo, os homens mais adiantados – Kamada, Götze, Lindstrom e Kolo Muani – oferecem diversas nuances à equipa, ora explorando a profundidade e a largura do terreno, ora promovendo rápidas trocas de bola e posicionais. Realce ainda para o papel de Sow, um “box-to-box” fiável. A procura constante pela vertigem, muitas vezes trai o conjunto na primeira fase de construção com erros primários no passe e no posicionamento defensivo. O espaço entre sectores, principalmente entre a linha defensiva e o meio-campo e entre o central direito (N’Dicka) e o lateral-direito (Lenz) também poderão ser explorados.
Os principais perigos individuais
Kamada é, talvez o elemento mais perigoso da equipa depois da saída de Kostic para a Juventus. O nipónico possui diversas armas que deverão ser tidas em conta, tem uma técnica apurada, é muito inteligente a escolher e a ocupar os espaços vazios nas entrelinhas, é criativo, um óptimo finalizador e pode actuar com eficácia em diversas posições na linha ofensiva, sendo que é mais “venenoso” quando parte do corredor direito e acciona as diagonais para o espaço interior. Os cinco golos apontados e duas assistências que tem em seis jogos esta temporada são um sério aviso para a equipa de Amorim.
Depois há também Jesper Lindstrom, um nome talvez menos conhecido dos adeptos, mas que não pode ser descurado. Há poucas semanas falámos sobre o dinamarquês, numa análise que realizámos a cinco estrelas a ter em atenção na Bundesliga, com a ajuda do comentador Tomás da Cunha.