Os pecados de Portugal frente à Sérvia, em mapas e analytics

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Portugal entrou em campo frente à Sérvia a precisar apenas de não perder, mas acabou a partida em desilusão e a necessitar de “repensar a sua vida”, caso queira marcar presença no Qatar. A crítica é unânime: Portugal entrou encolhido e mais se encolheu com o golo madrugador, numa partida em que se foi sentindo quase sempre uma incompreensível inferioridade colectiva face ao adversário, incompatível com a valia individual das opções à disposição de Fernando Santos.

Mas terá sido assim tão mau? É o que nos propomos descobrir, procurando identificar as fragilidades demonstradas naquela que era uma jornada decisiva. Avancemos então, ponto a ponto.

Rematar, pouco e mal

Portugal já não rematava tão pouco num jogo oficial competitivo desde que foi goleado pela Alemanha por 4-2, a 19 de Junho de 2021, na segunda jornada do EURO 2020. A diferença é que nesse jogo Portugal não só marcou dois golos em oito remates como justificou plenamente o pecúlio, com 2,1 de Expected Goals.

[ Dos nove remates lusos quatro foram feitos de fora da área e apenas três saíram enquadrados ]

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Já frente à Sérvia, a Selecção ficou-se pelos nove remates, mas, excepção feita ao tiro certeiro de Renato Sanches (0,27 xG), todos de “fraca carga”. Os comandados de Fernando Santos ficaram-se pelos 0,6 xG, precisamente o mesmo (fraco) registo que somaram na jornada anterior, frente à Irlanda, os dois totais de golos esperados mais baixos de Portugal nos últimos 12 jogos oficiais (Qualificação Mundial e EURO 2020). Os lusos mais rematadores foram Cristiano e Renato Sanches, ambos com três tentativas, mas, entre os dois, apenas o médio autor do único golo português enquadrou disparos (2).

Se dúvidas houvesse acerca da forma conservadora como Portugal encarou o jogo basta referir que, na Sérvia, a Selecção somou quase o dobro dos remates (16), com 1,6 de Expected Goals.

Não foi preciso água para encolher Portugal

A posição média com bola dos portugueses (vide grafismo seguinte) é a melhor visualização que podemos dar, na hora de fundamentar a forma reactiva e expectante como a Selecção encarou um jogo em que tinha tudo na mão. Sendo certo que o golo de Renato Sanches apenas acentuou mais uma tendência que certamente já estaria definida desde a “palestra”, a verdade é que Portugal terminou a partida com apenas cinco jogadores com posição média no meio-campo ofensivo. Já a ambição dos sérvios fica bem patente nos nove a dez jogadores para lá da linha de meio-campo, bem como o facto de terem como principal tendência de passe as (18) combinações entre Kostic e Milinkovic-Savic.

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Adeus qualidade de passe, toma lá bola, óh sérvio

Portugal guardou para a última jornada uma fava: foi a primeira vez que terminou a partida com menos de 80% de eficácia de passe (78%) e bem abaixo da média até então (87%). Mas pior do que a eficácia global de Portugal nas entregas foi o sucesso no passe vertical. A Selecção ficou-se pelos 57% (contra 68% dos sérvios), num capítulo onde, até este jogo, apresentava uma média de 70% de eficácia.

Trocando números por palavras: a Selecção não conseguiu circular bola em direcção à baliza adversária, e os cruzamentos de bola corrida foram a cereja no topo do bolo neste capítulo. Portugal tentou 11 cruzamentos, mas foi eficaz em apenas um e nem sequer efectuado para o interior da área Sérvia. Já o adversário procurou e bem (com as consequências que se viu aos 90 minutos) explorar essa opção, com quatro certeiros em 24 tentativas.

[ Os 11 cruzamentos lusos. Apenas um eficaz, da autoria de Nuno Mendes ]

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Mas a dimensão dos problemas no passe não ficaram por aqui. Mesmo jogando na expectativa, Portugal falhou 18 passes de risco (passes realizados ainda no seu meio-campo defensivo), menos quatro apenas do que uma Sérvia apostada em lutar contra as probabilidades. A identificação dos líderes desta fraca tendência ajuda a perceber a gravidade das dificuldades sentidas pela Selecção: Rúben Dias, João Cancelo e Nuno Mendes falharam três passes de risco cada.

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As contas da perda de posse reforçam o cenário até agora traçado. Os sérvios perderam 11 vezes a bola no seu terço defensivo. Portugal foi às 15 perdas, e seis delas na zona frontal da sua área, com o flanco esquerdo a ser também protagonista e não pelo homem que provavelmente espera: Diogo Jota perdeu quatro vezes a posse em zona proibida (primeiro terço), contra duas de Nuno Mendes.

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Pelo ar? Mandou quem nos veio visitar

Portugal pode não ser conhecido pelo domínio no jogo aéreo, mas com homens como Danilo, Cristiano e José Fonte seria de esperar algo mais do que o preocupante saldo final na disputa de duelos aéreos, ofensivos e defensivos. A Selecção travou 11 duelos aéreos ofensivos, ganhou apenas dois e nenhum deles sequer nas imediações da área adversária.

[ Portugal foi incapaz de vencer um único dos seis duelos aéreos travados no último terço ]

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Para piorar as coisas, lá atrás o cenário também não foi satisfatório e até teve consequências no marcador. Portugal venceu metade dos duelos aéreos defensivos que disputou, sendo que, no lance capital, não foi capaz de oferecer oposição ao decisivo cabeceamento de Mitrovic, lance que não conta sequer como duelo aéreo, precisamente pela forma confortável como o avançado pôde atacar a bola, bem dentro da área lusa.

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Portugal fecha a fase de grupos encolhido e em perda, somando apenas 1,2 golos esperados em mais de 180 minutos de futebol. A Selecção tem agora até Março para recuperar a confiança e o foco, que permitam resgatar a presença no próximo Mundial, sendo certo que a receita aplicada nas últimas duas partidas não será certamente a solução para atingir tal objectivo.

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