Reforços | Morita, a nova engrenagem que Amorim procura

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A estratégia leonina de aposta em valores seguros da Liga Bwin tem sido clara, nas últimas épocas. Nomes como Pedro Gonçalves, Nuno Santos, Manuel Ugarte, Marcus Edwards, Matheus Reis ou Rochinha são disso exemplo. Uma das últimas aquisições do Sporting, Hidemasa Morita, também deu nas vistas em duas épocas na Liga Bwin, ao serviço do Santa Clara, tendo mesmo despertado o interesse de emblemas turcos. O japonês é aposta clara de Rúben Amorim para 2022/23 e nós cá estamos para olhar às características do japonês, com os nossos números e a competente opinião do analista e scout da SportTV, Nuno Oliveira

[ Os números (muito semelhantes) de Morita nas duas épocas ao serviço do Santa Clara ]

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As estatísticas essenciais de Morita nas duas últimas épocas destacam uma evidência: o japonês é, acima de tudo, um jogador consistente. De uma temporada para a outra os números variaram pouco, pelo que é fácil perceber com o que contar. Essa regularidade, qual relógio suíço, terá sido uma das razões que levaram o Sporting à sua contratação, sabendo-se da importância que Rúben Amorim dá à solidez no meio-campo, ao rigor dos processos, à inteligência táctica e às diferentes valências que cada jogador poderá dar à equipa, conforme os jogos, os momentos e as necessidades, com sentido de responsabilidade e compromisso colectivo.

Muito antes da lesão grave de Daniel Bragança, já Morita estava nas cogitações do “leão”. O processo demorou, mas o nipónico chegou a Alvalade, prometendo ser um polivalente para ir apagando “fogos” no meio-campo sportinguista, dadas as suas características, que vão buscar um pouco a cada um dos concorrentes ao lugar de médio-centro, mas também ao de médio-defensivo, posição que também interpreta.

[ O heatmap e as acções com bola de Morita na Liga Bwin 21/22 ]

Sejam quais forem os planos do treinador “verde-e-branco”, há detalhes do futebol de Morita que não enganam. “A olho” claramente a sua capacidade de pensar o jogo, ditar ritmos e tornar o futebol da equipa mais cerebral. Depois, mostra que não tem medo de assumir o jogo, algo que fica patente na qualidade (e quantidade) de passe e que se torna mais relevante tendo em conta que o Santa Clara não era propriamente uma equipa de ter muita bola. Na época passada, em números absolutos, foi o nono médio da Liga no número de passes (1203, ou 47,9 por 90 minutos), o sexto em passes aproximativos (138, 5,5 por 90m), o sétimo em passes longos (158, 6,2 por 90m) e o terceiro em verticais (472), sendo segundo na média por jogo (18,8).

[ Passes verticais (à esquerda), passes aproximativos e passes longos de Morita na Liga Bwin 21/22 ]

Morita não é, portanto, um jogador apenas de passe para o lado. Sabe quando o fazer, é certo, mas tem a tendência para a entregar com a ideia de lançar colegas na frente, ajudando na progressão da equipa. Por outro lado, é um jogador que sabe recuar e fazer o seu papel defensivo, daí ser um futebolista capaz de interpretar o papel de médio-defensivo. Na última Liga, entre médios que disputaram mais de 1530 minutos (50% do total possível), foi mesmo o segundo com melhor média de intercepções por 90 minutos, nada menos que 1,8, apenas atrás dos 2,0 do seu colega de equipa, o brasileiro Anderson Carvalho. No que toca a recuperações de posse, foi o oitavo centrocampista em média, com relevantes 6,9 por jogo.

[ As acções defensivas (à esquerda) e as recuperações de posse de Morita na Liga 21/22 ]

“Uma inteligência fora do comum”

“Morita é um jogador que em termos posicionais pode jogar na posição ‘6’ ou ‘8’ neste Sporting de 2022/23, dependendo muito do que o jogo estiver a pedir, sendo um atleta que mostra uma inteligência fora do comum na forma como aborda o jogo e como consegue determinar os ritmos da equipa”, descreve o analista e scout, Nuno Oliveira.

“Jogando a ‘6’ consegue ver o jogo quase sempre de frente e usar o seu passe longo de qualidade e capacidade de organizar o ataque na primeira fase de construção; na posição ‘8’ poderá dar ao Sporting capacidade de controlar alguns jogos e de respirar com bola, com a sua qualidade de passe curto e critério na decisão, característica que não conseguimos ver tanto em Matheus Nunes”, prosseguiu. “Se a própria equipa o conseguir colocar em zonas mais adiantadas, podemos esperar algumas assistências dada a sua qualidade do último passe, detalhe pouco visto no Santa Clara por ocupar zonas mais recuadas no terreno.”

A chegada do japonês dará a Amorim  novas opções, tendo em conta as diferentes características de jogos e adversários, com o nipónico a dar uma qualidade extra em momentos muitos específicos dos encontros. “Morita vem trazer algo que o Sporting não tinha no plantel. Em termos estatísticos foi dos jogadores com mais passes efectuados por jogo na época transacta, mesmo estando numa equipa que, na maioria dos encontros, não controlava a maior parte da posse da bola, sendo que, numa formação grande, estes valores devem aumentar. Haverá momentos da época em que o Sporting quererá controlar os jogos com bola e Morita parece-me que será o jogador certo para esses momentos, pois mostra critério em todas as acções que faz”. Mas nem tudo são pontos positivos, como explica Nuno Oliveira. “Ao invés, é um jogador que se sente mais desconfortável se o jogo ficar demasiado partido, se o meio-campo do Sporting ficar muito afastado dos três elementos da frente pode ter dificuldade em ser o médio de ligação dos os sectores”.

[ Os comparativos que interessam: Morita, Matheus Nunes, Manuel Ugarte e Daniel Bragança ]

O médio terá, no entanto, que trabalhar muito para ser uma opção regular para Rúben Amorim, que parece ter estabelecida a dupla mais central no “miolo” leonino. Tudo dependerá da adaptação a uma nova realidade. “Parece-me que, neste momento, Morita partirá atrás da dupla composta por Ugarte e Matheus Nunes, mas sendo a alternativa óbvia para qualquer uma das posições, podendo adaptar-se facilmente à especificidade de cada posição. Sendo portador de características diferentes do uruguaio e do português, fará parte do trabalho de Rúben Amorim encaixar o jogador nas dinâmicas da equipa. Neste momento, o Sporting parece-me bem salvaguardado com três médios distintos, que podem responder aos diferentes desafios que o Sporting irá enfrentar durante a época”.

Em jeito de conclusão, o Sporting ganha inteligência táctica, noção de ritmos de jogo, de variação no tipo de passe e na quantidade (e qualidade) do mesmo. Morita organiza, coordena, lança como poucos o futebol de transição que o Sporting tanto gosta e aplica-se nas tarefas defensivas, podendo ser um “8” ou um “6”, conforme as necessidades. Titular? Ainda não, mas o japonês poderá assumir um papel fundamental na equipa de Alvalade.

Confere as análises aos outros reforços neste link.

Pedro Tudela
Pedro Tudela
Profissional freelancer com mais de duas décadas de carreira no jornalismo desportivo, colaborou, entre outros media nacionais, com A Bola e o UEFA.com.