Rosier, mero “upgrade” ou caso sério?

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Numa época em que Bruno Gaspar cedo mostrou estar algo longe do nível esperado e em que Stefan Ristovski nunca conquistou lugar indiscutível nos corações sportinguistas, era notória a necessidade de um lateral-direito de qualidade superior no plantel do Sporting. Esse problema aparenta estar resolvido, com o elevado investimento de oito milhões de euros – quinta contratação mais cara da história do clube – em Valentin Rosier, oriundo do Dijon.

Tendo passado pela formação do Rodez e feito ainda uma temporada na equipa sénior do clube, Rosier saltou para o Dijon, onde fez cerca de época e meia como titular absoluto na Ligue 1 – sendo inclusivamente utilizado com frequência como titular na selecção Sub-21 gaulesa durante a qualificação para o campeonato da Europa do escalão. Após 2781 minutos no campeonato em 2017/18, somou apenas 1458 na última temporada, com uma lesão num pé em Dezembro a deixá-lo de fora até ao fim da época. Entender a condição física e mental com que o jogador aborda a nova temporada, sendo que jogou apenas dez minutos em 2019, será crucial para a sua adaptação ao Sporting.

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Ao investir num jogador oriundo de uma das Ligas de topo do futebol europeu, o Sporting quebra um pouco a abordagem habitual dos “grandes” portugueses ao mercado, mas terá de lidar com outras preocupações – neste caso adaptar o jogador de uma equipa pequena (Dijon acabou no “play-off” de descida) em Liga grande, para uma equipa grande num campeonato menor.

Com bola, muito prometedor

Neste tópico, as notícias aparentam ser positivas para os “leões”: até à 17ª jornada da Ligue 1 (o período em que Rosier jogou na última época), o Dijon era uma equipa que tentava trabalhar bastante com bola. O conjunto comandado por Olivier Dall’Oglio era, na altura, o sexto com mais passes (446,7) e acções com bola (651,6) no campeonato, pelo que a abordagem de Marcel Keizer, muito assente no jogo de posse, não será de estranhar para o jogador gaulês.

Mesmo de um ponto de vista individual, Rosier mostra segurança no momento da construção, com eficácia de passe bem acima da média (84%), mesmo no meio-campo adversário (80%). Ristovski era o lateral-direito em Portugal com melhores eficácias de passe na Liga NOS (82% no geral e 79% no meio-campo adversário) – muito por influência do sistema em que estava inserido – e mesmo assim Rosier consegue superá-lo. O francês recorre pouco ao passe longo (3,3), mas mantém uma eficácia interessante quando os procura para o último terço: 44%, mais do que qualquer lateral-direito da Liga NOS na última temporada.

Rosier mostra ainda bastante aptidão e qualidade técnica no momento de progressão com bola. Não atinge os números da elite de laterais da Ligue 1 no drible, mas 1,0 dribles completos por 90 minutos, combinados com 57% de eficácia, são indicadores bastante interessantes. Ainda para mais quando comparado a Ristovski, que oferecia pouca progressão e completava em média apenas 0,1 dribles. Sendo um jogador que arrisca bastante, acaba muitas vezes desarmado (1,5), um problema ligeiramente atenuado pelo facto de apenas 0,3 dessas situações ocorrerem no seu meio-campo defensivo, mas que acaba por ser um destaque negativo.

Na chegada ao último terço surgem mais pontos de análise. O lateral acabou a temporada com boa eficácia de cruzamento (26%), mas números bastante baixos tanto no que toca ao volume de cruzamentos (1,7), como passes para finalização (0,7). Rosier estava inserido numa equipa que recorria muito menos do cruzamento (10,7) do que o Sporting, que é uma das formações em Portugal que mais procura estas situações (15,3), e num contexto em que não tinha tanta gente a chegar a zonas de finalização nem avançados tão competentes no jogo aéreo como terá Alvalade. Por todas estas razões, será natural o crescimento do jogador neste momento do jogo, mas haver essa necessidade de melhoria em algo que será tão importante não é o ideal.

O francês tem, no entanto, a característica interessante de ser dos laterais do seu campeonato que mais procura zonas interiores para remate. Faz cerca de 0,9 remates de bola corrida – números não superados por nenhum lateral, esquerdo ou direito, em Portugal –, sendo que essa procura de espaços interiores poderá, por cá, ser muito útil para penetrar na organização defensiva dos adversários de menor dimensão.

Impetuosidade no desarme

Defensivamente, Rosier é um lateral muito activo: soma muitas intercepções (2,0) e foi o lateral-direito da Ligue 1 com mais bloqueios de passe (1,3) e de cruzamento (0,7). No desarme, as coisas pioram um pouco. Na temporada falhou 25% das suas tentativas, sendo driblado com alguma frequência, sobretudo no primeiro terço (0,6). Isso acresce ao facto de ser um jogador demasiado faltoso. A média de 2,2 faltas e 0,7 faltas no primeiro terço é superior à de qualquer defesa-direito na passada Liga NOS.

A qualidade superior dos adversários que tem vindo a enfrentar acaba por oferecer um brio extra na contextualização dos dados defensivos do francês e o facto do Dijon ter utilizado uma linha defensiva bastante subida durante a primeira metade da temporada passada é outro ponto positivo no processo de adaptação.

Potencial elevado

Valentin Rosier foi um investimento avultado numa posição de extrema carência para o Sporting e o “upgrade” parece claro perante as outras opções no plantel. Contudo, entender até que nível exibicional chegará com a camisola dos “leões” estará muito dependente da sua evolução enquanto jogador. Chegar de um nível competitivo elevado é positivo mas, tal como ter internacionalizações Sub-21 por uma das melhores selecções do mundo, é algo que acrescentou ao custo da transferência.

Sendo que alguns dos seus pontos menos fortes coincidem com o que mais se pede a lateral de um grande em Portugal, a sua evolução sob o comando de Keizer será chave para determinar se Rosier é um mero (e caro) “upgrade” ou, eventualmente, um dos que melhores do campeonato na sua posição.

Tiago Estêvão
Tiago Estêvão
Performance Analyst na GoalPoint, já colaborou com a Statsbomb e WhoScored, entre outros.