Afinal, qual é a melhor dupla para o meio-campo dos “encarnados”? João Neves e Orkun Kökçü? Florentino e João Neves? Florentino e Kökçü? Ou os três… em simultâneo? O “multiusos” Aursnes também pode ser uma boa solução para a ajudar a resolver este quebra-cabeças, que se tornou numa discussão generalizada nos diversos meios, gerando um aceso debate, por vezes comparando “Tino” ao jogador turco. Um tema que não pode, nem deve, deixar de fora Neves e que favorece um manancial de pontos de vista.
Esta tem sido uma das principais incógnitas deste Benfica versão 2023/24. Falamos da conjugação de valores na zona central do terreno. Passados sete meses desde o início da temporada, a preferência de Roger Schmidt pela dupla formada por João Neves e Orkun Kökçü não deixa dúvidas, mas no actual figurino com Rafa, João Mário, Di María e Arthur Cabral, a equipa fica sempre muito exposta sempre que não tem a bola, faltando agressividade na recuperação do esférico por parte dos nomes que jogam à frente destes dois médios e acaba por ser normal ver o conjunto “partido” dada a fragilidade denotada neste capítulo.
Tanto Neves, como Kökçü são dois jogadores que se sentem mais confortáveis a actuar numa zona mais adiantada do terreno e, jogando em simultâneo, acabam por, de certa forma, anular-se, já que são dois “8”, médios “box-to-box”, com chegada à área adversária e que, desta forma, têm de se preocupar (ainda) mais com as tarefas defensivas.
A entrada de Florentino Luís no “onze”-base poderia ajudar a “libertar” um deles ou até os dois, mas isso teria de significar uma de várias coisas: ou o turco passaria a jogar a partir do corredor esquerdo, implicando a saída de João Mário, ele próprio iria para o banco ou o figurino táctico teria uma outra roupagem, algo que dificilmente irá acontecer, já que o treinador alemão raramente mexe no 1x4x2x3x1 (ou 1x4x4x2, conforme as análises).
[ Os heatmaps de Florentino e Kökçü ]
O que ganha o Benfica com Florentino?
Capacidade defensiva, um maior equilíbrio entre os sectores, agressividade sem a bola, além de que ajuda a “soltar” João Neves e/ou Orkun Kökçü para se aproximarem das zonas de finalização e efectivarem a pressão. E como é que “Tino” consegue tudo isso? Liderando em diversas variáveis por 90 minutos, entre jogadores com pelo menos 842 minutos jogados:
- Jogador da Liga com mais desarmes (5,2), realizando 25% dos desarmes que o Benfica faz por jogo;
- Jogador da Liga com mais intercepções (2,7), correspondendo a 31,1% da média das realizadas pelo SLB;
- Jogador da Liga com mais acções defensivas no meio-campo contrário (4,1), 26.6% das dos “encarnados”;
- Jogador do Benfica com mais acções defensivas em termos gerais (10,6), quarto na Liga, ou 19,1% da equipa de Roger Schmidt.
[ Desarmes (à esquerda), Intercepções e global de acções defensivas (à direita) ]
Polvo Florentino 🐙 Números impressionantes da @_Goalpoint 🧐 pic.twitter.com/IRlXqJAevJ
— Betano Portugal 🔞 (@Betano_PT) February 8, 2024
O que perde a equipa com Florentino em campo?
Menos criatividade no “miolo” do terreno com a bola, eficácia nos passes aproximativos e de ruptura, e mantendo-se a aposta no duo Neves e Kökçü no “onze”-tipo. João Neves lidera mesmo na Liga em termos de recuperações posicionais de posse, ou recuperações passivas, sendo que, no Benfica, o segundo com mais é Kökçü e Florentino surge apenas em terceiro, e com somente 7% de contribuição ofensiva (remates mais passes para finalização). Aí entra o turco em campo.
- Kökçü é o terceiro benfiquista com maior contribuição ofensiva (23%);
- O turco é a segunda “águia” com melhor média de passes para finalização (2,3 por 90 minutos);
- E é o líder da Liga em passes progressivos (que aproximam a bola pelo menos 25% da baliza contrária), extraordinários 9,5.
[ Remates (à esquerda), passes para finalização e passes progressivos de Kökçü (à direita) ]
“O que o Benfica ganha com Florentino sem bola, perde com bola e vice-versa com Kökçü”
(Pedro Bouças)
O analista e treinador Pedro Bouças ajudou-nos a tentar decifrar esta espécie de enigma que reina na sala de máquinas dos detentores do título nacional. Afinal, qual é a melhor solução?
“Acredito que este Tino versus Kökçü seja muito difícil para o treinador. É evidente que Florentino melhora muito a equipa sem a bola, permitindo que a equipa recupere jogo em terrenos mais adiantados e tenha mais condições para atacar. Por outro lado, com bola, quando entra no processo ofensivo, o Florentino é um jogador que, sistematicamente, toma más decisões, erra passes e, quando digo erra passes, eles até podem chegar ao colega, mas não chegam nas melhores condições, no pé certo, no tempo oportuno para o espaço certo e isso atrasa muito o jogo do Benfica. Em sentido contrário, Kökçü é o jogador da Liga com maior capacidade para fazer passes progressivos, com maior capacidade para romper linhas, para acelerar a transição ofensiva da equipa quando ganha a bola ao adversário. É um jogador que tem chegada à frente, tem golo e capacidade para finalizar e, portanto, tudo aquilo que o Benfica ganha com Florentino sem bola, perde com bola e vice-versa em relação a Kökçü”, realça o comentador do Canal 11 em declarações ao nosso “site”.
Desde sempre que o antigo capitão do Feyenoord foi o eleito por Roger Schmidt para substituir Enzo Fernández. A transferência não ocorreu em Janeiro, mas acabou por ficar selada no último Verão de 2023.
“É a aquisição mais cara de sempre do Benfica, mas isso é algo que se tem verificado todos os anos. Com a saída do Enzo, se tivéssemos tido mais tempo em Janeiro, teria sido o escolhido. Tem uma leitura de jogo fenomenal e podemos chegar a estes valores porque sabemos que vai acrescentar muito à equipa. Percebemos que podíamos chegar a estes valores e não hesitámos”, as palavras são do presidente benfiquista, Rui Costa, quando em 5 de Setembro do ano passado analisou o mercado da equipa e os €25M desembolsados no passe do número “10”.
Na opinião de Pedro Bouças, o jogador ideal seria… Enzo Fernández.
“Diria que os dois, num só jogador, seria o médio perfeito: o Enzo Fernández, por exemplo. Percebo que, para Roger Schmidt, seja difícil porque jogar com Kökçü e João Neves é, no fundo, estar a actuar com dois números ‘8’, e perde aí um recuperador, trabalho defensivo, capacidade de recuperação defensiva, capacidade de desarme. Por outro lado, o Benfica joga com dois jogadores muito mais qualificados para o seu jogo com bola. Do ponto de vista colectivo, não consigo dizer que um traz melhores coisas do que o outro, acho que depende muito dos jogos, da natureza dos adversários, das características deles, qual será a melhor opção. Naturalmente, o cenário perfeito seria ter um jogador número ‘6’ que fosse grande recuperador de bolas, mas com outra capacidade ofensiva do que Florentino, e entre João Neves e Kökçü jogar um dos dois”, apontou o especialista à GoalPoint.
Em suma, este Benfica é bastante diferente daquele que conquistou a última edição da Liga, principalmente do que brilhou até à saída de Enzo Férnandez. Com o argentino, Florentino, Gonçalo Ramos e Aursnes a equipa ganhava uma agressividade sem a bola que conseguia disfarçar as lacunas de João Mário e de Rafa no momento pós-perda, algo que Arthur Cabral (apesar dos esforços e da melhoria que tem apresentado desde que chegou da Fiorentina), João Mário, Rafa e Di María não conseguem fazer.